Estudante, Luis Gustavo, de Itambé, na Mata Norte, é um dos maiores defensores do estudo da língua espanhola frente à inglesa, após experiência de intercâmbio pela rede pública de ensino.
O garoto ficou inseguro quando o embarque se aproximava, mas voltou da experiência mais maduro, segundo atesta Vânia Batista Barros, coordenadora da escola. Foto: Rafael Martins/DP |
Era setembro de 2016 e ele trocaria a Escola de Referência em Ensino Médio Frei Orlando pela Europa, num intercâmbio promovido pelo Programa Ganhe o Mundo, que leva mais de mil alunos da rede pública de ensino ao exterior todos os anos. Seria o primeiro carimbo em seu passaporte. “Nunca havia imaginado cruzar o oceano. Entrei em desespero no dia anterior e pensei em desistir. Só não fiz isso porque me preocupava com o que os outros iriam dizer de mim, aqueles que envolvi no processo seletivo, meus avós, minha mãe, os professores, colegas…”, lembra o garoto.
Antes da viagem, Luís ficou paralisado pela insegurança de se afastar da avó, Ana Lúcia (esquerda), e da mãe, Ana Carlota (direita). Foto: Rafael Martins/DP |
O centro de ensino de Itambé teve outros alunos contemplados pelo programa, a exemplo de Sabrina da Silva Lima e Fernando do Nascimento Santos, ambos de 17 anos e com incursão no Canadá. “Os ganhos vão muito além do idioma. Voltamos transformados, com nova visão de sociedade”, conta Fernando, que agora estuda para o vestibular em psicologia. Sabrina, que planeja cursar engenharia elétrica, diz que a experiência no exterior foi de autoconhecimento: “Falei com minha família quatro vezes durante cinco meses de viagem. Queria saber quem eu era caso ninguém me conhecesse e voltei mais segura, corajosa, mais eu mesma”, relata.
“Os meninos voltam mais maduros e a diferença no rendimento escolar é perceptível. Eles saem de uma cidade pequena e descobrem a real dimensão do mundo”, conta a coordenadora pedagógica Vânia Batista Barros. Segundo ela, as oportunidades geradas pelo programa estadual têm provocado uma migração de alunos da rede particular de ensino em Itambé para a escola pública, de onde apenas em 2017, 15 estudantes viajarão para o exterior. No estado, serão 1.050, dos 184 municípios, para os três destinos estrangeiros, que incluem também a Nova Zelândia.
Sabrina da Silva Lima e Fernando do Nascimento Santos, ambos de 17 anos, fizeram intercâmbio no Canadá. Foto: Rafael Martins/DP |
Seja qual for o país, há uma aflição recorrente de alunos e familiares com a distância e de como os jovens cidadãos se comportarão, sozinhos, em outra extremidade do mundo – sensação normalmente só diluída com a conclusão da experiência. “Fiquei feliz quando soube da aprovação dele no programa, pois era o que ele mais queria, só falava nisso… mas, durante os cinco meses, chorei todos os dias. Na volta, mandei pintar uma faixa e organizei uma comitiva de familiares para esperá-lo no aeroporto, no Recife”, conta a avó de Luís, Ana Lúcia, que vive com ele e outros dois de seus irmãos, José Guilherme, 12, e João Gabriel, 9.
Para quem “o mundo” acolhe, as idas e vindas são sempre grandes acontecimentos – e antecedem mudanças ainda maiores e significativas. “Quando me dei conta que deixaria meus pais espanhóis, abracei minha mãe Josefa enquanto preparávamos o jantar e comecei a chorar”, lembra o jovem. “Chorei para ir e chorei para voltar”, ele ri. Hoje, o garoto que pretende cursar direito ou história coleciona questionamentos. Muitos deles bem diferentes dos que fazia antes da viagem ou, mais além, quando estava prestes a voltar. Vai deixar Itambé? Vai retornar a ver os pais acolhedores, com quem fala por telefone ou internet toda semana? Vai voltar à Europa? Pensamentos comuns em quem percebe um tamanho de mundo sequer imaginado. “Se eu não tivesse ido, teria um arrependimento sem remédio. A gente cresce quando percebe que tem que se virar sem mãe, pai, avó. E isso tem consequências para a vida toda”.
fonte: Diário de Pernambuco
Redação
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